Um marco divide Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga. É a prisão do poeta, em 1789, por envolvimento na Inconfidência Mineira. A primeira parte da obra, de antes da prisão, é sonhadora, a máxima expressão do arcadismo brasileiro, na temática pastoril e na adoração à musa.
Na segunda, a beleza bucólica é substituída pelo escuro da masmorra, os belos pássaros por abutres. Já na primeira parte, havia pressa para a consumação do amor, antes que o tempo roubasse ao corpo as forças - a inspiração para Marília, Maria Doroteia, era 22 anos mais nova que Gonzaga.
Na prisão, os cabelos branqueiam e caem, a pele enruga, e só a impossível presença da musa seria capaz de lhe devolver a mocidade. Se no início Dirceu é vítima do Cupido, que lhe impõe o amor, a partir da detenção vira refém também da Fortuna, que o condena à solidão e à injustiça.