A situação política vivenciada nos últimos anos no Brasil, com a ascensão da extrema
direita ao poder, evidenciou uma falsa oposição no campo educacional. Expoentes de uma suposta "escola sem partido" escancararam um desprezo pelo patronato atribuído a Paulo Freire pela Lei n.º 12.612, de 2012, promulgado pelo Governo de Dilma Rousseff. Tal desprezo perde na tentativa de revogação da Lei, em 2017, e nos argumentos falaciosos do presidente
eleito, em 2018, de que o fracasso educacional no país estaria associado ao uso do método freireano nas escolas, culminando na incitação do discurso nas redes sociais da necessidade de expurgar a ideologia de Paulo Freire. Em 2021, em meio à pandemia de Covid-19 e ao avanço das políticas neoliberais na educação, o educador nordestino é celebrado mundialmente por ocasião do centenário de seu nascimento.
Tais contextos reposicionam e fortalecem os movimentos de luta pela educação popular e grupos de pesquisa em diversas instituições educativas, sobretudo nas universidades, em torno da defesa do legado de Paulo Freire. Para além do debate partidário, o que se pretende evidenciar é a politicidade da educação e, ao mesmo tempo, a própria educação
enquanto prática da liberdade de pensamento e expressão da palavra, que instaura a condição humana desde a infância. Uma prática que circunscreve e, dialeticamente, é circunscrita pela luta de classes.
Afirmar o legado de Paulo Freire para instituir uma educação contextualizada com o semiárido baiano e dar visibilidade às forças contra hegemônicas que reconfiguram modos de pensar a infância, a formação docente, as práticas educativas, a relação com a cultura escrita e a ação/conscientização frente aos problemas de nosso tempo é, desse modo, um compromisso assumido na escrita e organização deste livro.
Celebrar a atualidade do pensamento freireano e as indeterminadas leituras que nos unem é nosso propósito, assim como o de constituir núcleos de resistência a modelos outros de educação que não dizem respeito à vida, à justiça social e à ética amorosa e transformadora das relações entre as pessoas.
Instaurar a dialogicidade com princípios e fundamentos da pedagogia de Paulo Freire é, pois, a abordagem escolhida na tessitura das vozes que se encontram nos textos deste livro. Vozes que anunciam, nos encontros entre diferentes áreas e objetos de conhecimento, valores políticos apresentados em seu pensamento contra toda forma vil de negação.