Um dos maiores desafios de um artista é transmitir ideias ou emoções complexas de maneira simples. Carlos Drummond de Andrade alcança este objetivo com maestria em Contos de aprendiz.
Publicado em 1951, Contos de aprendiz marca a estreia de Carlos Drummond de Andrade nas narrativas propriamente ficcionais.
Nascido em uma região rural, Drummond incorpora essa experiência em muitas dessas quinze histórias, a exemplo de "A salvação da alma", em que a infância e a adolescência de cinco irmãos são atravessadas pelo clima bucólico e ingênuo do interior do país na primeira metade do século XX, e "O sorvete", no qual dois meninos enfrentam o dilema de experimentar ou não pela primeira vez uma até então desconhecida iguaria.
Aos poucos, as histórias avançam em direção às grandes cidades, mostrando sua lenta transformação. O talento de Drummond para a clareza e a elegância narrativa colabora para a construção psicológica de seus personagens. Na longa narrativa tchekhoviana "O gerente", o autor vai aos poucos construindo (e desconstruindo) o protagonista Samuel, um bancário que frequenta o jet set carioca e é acusado de um crime bizarro, sendo por isso apelidado pelos jornais de "o Vampiro dos Salões". Drummond cadencia as revelações e deixa o leitor "espiar" os acontecimentos, ao mesmo tempo que mostra a complexidade de "pessoas comuns".
Outro ponto alto da fabulação drummondiana é "Meu companheiro", a divertida história do cachorro Pirolito, que tem o "dom" de falar com seu tutor, o pacífico professor Motinha. Entre a fantasia e o realismo, o escritor constrói uma narrativa emocionante sobre a amizade.
Com a publicação de Contos de aprendiz - quando Drummond entrava na quinta década de vida e já era um autor consagrado -, os leitores brasileiros tiveram um motivo a mais para comemorar: nosso maior poeta se revelava também um grande ficcionista.