Pelo seu impacto público, o cinema constitui um testemunho privilegiado das sensibilidades populares, das adesões e rejeições políticas de uma determinada época, podendo o filme de ficção informar melhor a este respeito do que o documentário. E em boa medida é assim porque o filme histórico, enquanto instrumento de elaboração das memórias colectivas, conta eficazmente um passado em competição com os agentes institucionais da memória.
Em O Século XX no Ecrã o autor analisa, através de uma vasta seleção de filmes, a representação audiovisual dos grandes acontecimentos do século XX. Neste excerto, em especial, Sand analisa a representação da ascensão do fascismo e do nazismo, e, por fim, do Holocausto. Apesar do extermínio de comunidades humanas ter ocorrido várias vezes na história, a destruição em massa de seres humanos durante a Segunda Guerra Mundial, planeada com tecnologia moderna e industrial, constituiu um fenómeno sem precedentes.
Tal como o autor nos mostra, a partir dos anos 1930 o cinema foi usado para propagar ideias racistas e mobilizar intenções ideológicas, tendo como alvo privilegiado as comunidades judaicas da Europa. Desde os anos 1940, vários filmes evocaram este mundo de perseguições e horrores. Embora nos primeiros anos do pós-guerra o número de produções sobre o extermínio em massa perpetrado pelos nazis ter sido limitado, foi gradualmente aumentando até se tornar num subgénero cinematográfico, com características próprias. Nos anos 1990 chega a sua consagração através dos Óscares.
A representação do Holocausto desenvolver-se-á até desembocar em alguns filmes com uma forte marca autoral, subjetiva, em alguns casos poemas-mitos, em contracorrente com a narrativa histórica, em que a tragédia que ceifou 11 milhões de vidas humanas se cinge aos 6 milhões de vítimas judaicas. É assim que a apreciação do historiador em relação a Resnais e a Lanzmann é claramente contrastada.